terça-feira, 31 de dezembro de 2013

a. m. pires cabral

FOLHA RUBRA

É bom sermos como essas folhas verdes
que prolongam todo o ano a Primavera.

Mas melhor do que isso
é sermos como aquela folha rubra
que antes das outras pressentiu o Outono
e vestiu para ele a sua melhor cor,

mesmo sabendo que o Inverno tem um plano
para em breve a dissolver no chão.

a. m. pires cabral, gaveta do fundo, Tinta da China, 2013, p. 71

sábado, 26 de outubro de 2013

Tadashi Kobayashi

The Shrike , 2004

Rainer Maria Rilke (1875-1926)

E nós somos como os frutos. Pendemos do alto de ramos estranhamente tortuosos e suportamos bem os ventos. O que temos é a nossa maturidade, a nossa doçura e a nossa beleza. Mas a força para tal emana de uma raiz que se propagou até cobrir mundos e mundos em todos nós. E, se quisermos testemunhar a favor do seu poder, então devemos utilizar, cada um, o nosso mais solitário sentido.
Quanto mais solitários houver, mais solene, comovente e poderosa será a comunidade.

Rainer Maria Rilke, Notas sobre a melodia das coisas, Averno, 2011

Bela Tarr, "A Torinói Ló" (2011)


domingo, 13 de outubro de 2013

Wallace Stevens (1879-1955)

TREZE MANEIRAS DE OLHAR UM MELRO

1. No meio de vinte montanhas nevadas
A única coisa que se mexia
Era o olho do melro.

2. Eu via as coisas de três maneiras diferentes,
Como uma árvore
Onde há três melros.

3. O melro rodopiava ao sabor dos ventos de Outono.
Era uma pequena parte da pantomima.

(...)

6. Gotículas geladas cobriam a grande janela
De vidros toscos.
A sombra do melro
Cruzava-a, dum lado para o outro.
O estado de espírito
Desenhava na sombra
Uma causa indecifrável.

(...)

9. Quando o melro voou para fora do alcance da vista
Assinalou a orla
De um de muitos círculos.

(...)

12. O rio corre.
O melro deve andar a voar.

13. Anoitecia em cada instante da tarde.
Nevava
E ia continuar a nevar.
E o melro empoleirado
Nos ramos dos cedros.

António Simões, Antologia de Poesia anglo-Americana, Campo das Letras, 2000, pp. 409-413

terça-feira, 8 de outubro de 2013

Curiosidades

Mycobacterium vaccae

Sabia que esta bactéria Mycobacterium vaccae se encontra na terra  e, estudos recentes, relacionam a sua presença com o aumento dos níveis de serotonina e norepinefrina no organismo? Assim, parece que quem se dedica ao trabalho da terra tem maior probabilidade de sentir-se mais feliz e menos deprimido do que quem não o faz.

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Egon Schiele

Autumn Trees

Thomas Bernhard (1931-1989)

No Jardim da Minha Mãe

No jardim da minha mãe
o meu ancinho junta as estrelas
que caíram enquanto eu cá não estive.
A noite está quente e os meus membros
exalam a proveniência verde,
flores e folhas, o grito do melro e o bater do tear.
No jardim da minha mãe
piso, descalço, as cabeças de cobras
que avançam, a espreitar, pelo portão ferrugento
com línguas de fogo.
Na Terra e no Inferno, Assírio & Alvim, 2000

terça-feira, 10 de setembro de 2013

Os produtos da Horta

Estamos a precisar de voluntários para mondar, colher e semear. Se gosta da terra e valoriza o trabalho voluntário (o que dá mais felicidade!), contacte-nos.
 

temos: Alecrim, açaflor, cidreira, acelgas, tomates, tomilho, salsa, basílico, alho-francês, alcachofra, alface, cenouras, pimentão doce, pimentos corno de cabra ...
 

ENCOMENDE os seus produtos: deixe a sua nota de encomenda dentro de um saco no bar de professores, indicando aonde quer levantar os produtos (no bar, ou na portaria do parque de estacionamento).
Em alternativa, deixe a sua lista no link comentários (abaixo desta mensagem), identifique-se e nós deixamos o seu saco na portaria do parque de estacionamento

Pode ainda contactar directamente os professores Luís Bettencourt ou Ana Paula Inácio.

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Notas: O pagamento (e/ou donativos) dos produtos hortícolas é entregue em mão à Sra. Ana Azevedo, na CONTABILIDADE (junto ao conselho executivo).

Traga um saco. 

Estamos a precisar de voluntários para mondar, colher e semear. Se gosta da terra e valoriza o trabalho voluntário (o que dá mais felicidade!), contacte-nos.

segunda-feira, 8 de julho de 2013

Michael Pollan

31
Sempre que possível, coma alimentos silvestres

Duas das plantas mais nutritivas do mundo - a quinoa e a beldroega - crescem naturalmente, e algumas das dietas tradicionais mais saudáveis, como a mediterrânica, recorrem frequentemente a verduras silvestres. Os campos e as florestas estão cheios de plantas que contêm níveis de fitoquímicos superiores aos das suas primas cultivadas. Porquê?
Porque essas plantas têm de se defender de pragas e doenças sem a nossa ajuda, e porque a nossa tendência histórica tem sido seleccionar e cultivar plantas pela sua doçura; muitos dos compostos defensivos produzidos pelas plantas são amargos. As nossas opções de cultivo também são influenciadas pelo prazo de validade, e por isso seleccionámos, sem nos apercebermos disso, plantas com níveis reduzidos de ácidos gordos ómega-3, visto que estas gorduras oxidam - ou seja, ganham ranço - rapidamente.

Michael Pollan, Saber Comer - As 64 Regras de Ouro, lua de papel, 2009, p.87

Square Foot Gardening

domingo, 30 de junho de 2013

Manuel Amado


Saint-John Perse (1887-1975)

XVIII
Agora deixem-me, vou sozinho.
Vou sair, pois tenho coisas a fazer: um insecto espera-me para
que o trate. Agrada-me
o grande olho facetado, anguloso, imprevisível como o fruto
do cipreste.
Ou então tenho um pacto com as pedras raiadas de azul: e
vós igualmente me deixais,
sentado, na amizade dos meus joelhos.
1908
 Elogios, Quasi, 2002 , p.  61

CANÇÃO

Parado o meu cavalo sob a árvore coberta de rolas, lanço um assobio tão puro, que não há promessas às suas margens que estes rios não cumpram. (Folhas vivas na manhã são à imagem da glória...)

E não é que um homem não esteja triste, mas levantando-se antes do dia e mantendo-se com prudência no comércio duma velha árvore, apoiado pelo queixo à última estrela, ele vê no fundo do céu em jejum coisas grandes e puras que dispõem ao prazer...

Parado o meu cavalo sob a árvore que arrulha, lanço um assobio mais puro... E paz àqueles que, se vão morrer, não chegaram a ver este dia. Mas de meu irmão, o poeta, tivemos nós notícias. Mais uma vez escreveu uma coisa muito doce. E alguns tiveram dela conhecimento...

Anabase, Relógio D'Água, 1992, p. 79

sábado, 29 de junho de 2013

João Bénard da Costa (1935-2009)

Há jardins – como os da Vila Imperial de Katsura, ou do Templo Tenriuji em Quioto – em que o que se procura é prolongar no espaço construído o espaço natural que o rodeia, por forma a que o jardim “espelhe” com a maior precisão possível a paisagem circundante. Cada planta é o duplo da que lhe está em frente, cada pedra a réplica da cascata «lá fora» existente, cada cor a que se acorda com a tonalidade encontrada no “exterior” (e com ela variando conforme as estações do ano). Através de uma técnica conhecida pelo nome de shakkei as montanhas, quedas de água, matas selvagens, são incorporadas no espaço do jardim, num arranjo paisagístico em que o “cenário” se interpenetra com o que o não é, de modo a restituir uma indissociável unidade e a multiplicar a ilusão até aos limites do que já não podemos ou sabemos classificar como tal. § Há jardins – como os do Palácio Imperial de Quioto – em que o ideal a atingir é tornar a intervenção humana tão discreta que esta se torne quase imperceptível. Como? Dispondo, por exemplo, entre a vegetação comum uma planta rara que aparentemente com ela se confunde, ganhando todo o seu valor pelo facto de não poder estar ali por “meios naturais” e conferindo a todo o espaço um peso de invulgaridade, pela mera presença de uma árvore ou flor inusual. É o caso da tangerineira do Palácio de Quioto (a tangerineira é uma árvore raríssima no Japão) que se destaca e confunde suficientemente das e com as plantas comuns que a cercam, para que tudo adquira o sentido de um tesouro, passando desapercebido a quem não distinga a diferente qualidade entre o “centro” e as suas “margens”, ou a quem nem sequer perceba que há centro e margens (pp. 69-70)

João Bénard da Costa, Quinze Dias no Japão, 2001

quinta-feira, 20 de junho de 2013

Anna Enquist

CENA CAMPESTRE

A casa esperou por nós
pensamos. O duplo renque de árvores
acena-nos que nos cheguemos. Num sussurro,
o rio vai escorrendo cheio
entre as margens.

À hora exacta, o sol vai esconder-se
por trás dos campos. A escuridão
envolve a casa que nos protege.
Acendemos o fogo, bebemos
entre as paredes.

Vendi-me inteira à
segurança e debruço-me da janela.
Dormem cavalos e galos, a água
pisca o olho à lua, e eu a pagar,
sempre a pagar.

Rosa do Mundo - 2001 Poemas para o Futuro, Assírio & Alvim, 2001, p. 1814

terça-feira, 18 de junho de 2013

Luís Quintais

Azagaia, Árvore, Sombra

Há objectos que perseguem a nossa infância,
depois, vida fora, esquecem-se os seus mágicos nomes,
a sonhada utilidade que os anima.

Poderíamos pressenti-los dentro de nós,
e isso sucede, por instantes, quando o fundo que os obscurece
se ilumina de repente

e os distinguimos a contra-luz.
Silhuetas animam-se na memória. Uma breve,
quase acessória, viagem no tempo começa.

Em África, na casa onde nasci, e depois de casa em casa
- eram frequentes as mudanças -
o meu pai pendurava uma azagaia na parede.

Sempre a mesma azagaia. Era um objecto nobre.
Marcava um hábito guerreiro: imaginar que a sustinha sobre a cabeça,
que a arremessava longe, trespassando a sombra

da árvore que se erguia no quintal.
Trespassava a sombra e não a árvore, repare-se.
E então a sombra, sob o sortilégio do imaginado arremesso,

começava a retrair-se e a afilar-se. Desaparecia.
Com o desaparecimento da sombra
ficava apenas a árvore e a longa azagaia presa ao solo.

A sombra de uma árvore visita-me agora.
Vem nos meus sonhos recentes dizer-me que há um livro
nos sonhos, e que esse livro se escreve

com a linguagem crepuscular da memória.
Sei que se trata de uma sombra orfã.
Que se soltou das contingências de lugar e luz

para viajar no eterno. Sei agora que a substância da árvore
se aliou à substância da azagaia. Que ambas vibraram,
continuam a vibrar, juntas.

Luís Quintais, A Imprecisa Melancolia, Teorema, 1995, pp. 10-11

Vashti Bunyan, Just Another Diamond Day

sábado, 15 de junho de 2013

Jardins do Antigo Egipto

Sennedjem in Deir-el-Medina (19º dinastia) representação do cultivo de cereais, de árvores e de flores

Rose, Lis, Printemps, Verdure - Guillaume de Machaut

Jardins medievais

«A ideia de jardim fechado, ou hortus conclusus, remonta aos primeiros jardins. Por detrás dos muros e contrastando com um ambiente árido, havia sombra, água, plantas em abundância e uma aparência de ordem. O hortus conclusus medieval oferecia também protecção e permitia o cultivo de plantas, de legumes e de frutos. (...) Os jardins tradicionais estavam divididos em compartimentos, quase sempre, dispostos geometricamente.»

Christopher Bradley-Hole  in "The Rose, the Lily & the Whortleberry - Medieval Gardens" 

Planta de hortus conclusus

The Lurie Garden with Piet Oudolf

Conference Of The Birds - Dave Holland

Herberto Helder

esquivar-se à sintaxe e abusar do mundo,
oh como em pedra trançada ficou dito,
ígnea pedra até ao fim de tudo e mais que tudo isso infundido,
lá onde fresca e unânime a terra que respira:
ferida funda
- e sem nada a ver com tudo,
os burrocratas indizíveis

Herberto Helder, Servidões, Assírio & Alvim, 2013, p. 85

sexta-feira, 14 de junho de 2013

domingo, 2 de junho de 2013

Rewilding made simple, George Monbiot

Adélia Prado

Bucólica nostálgica

Ao entardecer no mato, a casa entre
bananeiras, pés de manjericão e cravo-santo,
aparece dourada. Dentro dela, agachados,
na porta da rua, sentados no fogão, ou aí mesmo,
rápidos como se fossem ao Êxodo, comem
feijão com arroz, taioba, ora-pro-nobis,
muitas vezes abóbora.
Depois, café na canequinha e pito.
O que um homem precisa pra falar,
entre enxada e sono: Louvado seja Deus!

Adélia Prado, Bagagem, Cotovia, 2002, p. 47

quarta-feira, 29 de maio de 2013

Emily Dickinson (1830-1886)

Tão pouco a Erva precisa de fazer -
Esfera de humilde Verde -
Com Borboletas só para pensar
E Abelhas entreter -

Mover-se todo o dia a belas Melodias
Que as Brisas vão buscar -
E no seu colo segurar o Sol
Fazer vénias a tudo -

Tecer de noite Orvalhos, como Pérolas -
E fazer-se tão fina
Que uma Duquesa, a coisa mais vulgar
Nem notícia seria -

E mesmo quando morre - esmaecer
Em odores tão divinos -
Especiarias Suaves, de dormir -
De Nardos, perecendo -

Depois, em Celeiros Reais viver -
E sonhar com os Dias a passar -
Tão pouco a Erva precisa de fazer -
Que eu queria ser um Feno -

Emily Dickinson, Cem Poemas, Relógio D'Água, 2010, p. 151


segunda-feira, 27 de maio de 2013

Às quartas

a feira continua animada:



(Fotos da Prof. Helena Meireles em 22/05/2013)

Bem hajam!